Em "Lisboetas", Sérgio Tréfaut filma a Lisboa estrangeira, clandestina, que todos os dias recebe milhares de imigrantes de países pobres em busca de trabalho, e procura dar voz aos casos reais de quem mal fala português, de quem é enganado por empreiteiros e patrões, de quem passa horas nas filas do SEF e se vê desorientado e atulhado na burocracia que a legalização exige. A câmara passeia mais por rostos do que por espaços, rostos assustados de quem chega a um país estranho. O contexto revela-se na sucessão das cenas: uma situação de trabalho, o telefonema para a família longínqua, o balcão das legalizações, a mercado negro do emprego, a venda ambulante de rosas, a aula de português, o apoio médico, os espaços de culto religioso, as danças nocturnas, as crianças...
O que torna este filme tocante é a opção por mostrar situações em que as pessoas se encontram em circunstâncias de grande vulnerabilidade. As comunidades de ucranianos, russos , brasileiros, africanos e chineses que viram para Lisboa à procura de melhores condições de vida fazem já parte do pano de fundo desta cidade. Os silêncios, a parcimónia com que a música é utilizada, os grandes e dolorosos planos das caras consegue dar uma dimensão humana...como esse indiano que deambula de mesa em mesa na Rua Augusta procurando vender uma flor. Depois, já madrugada, passa o arco e refugia-se com outros imigrantes num banco de madeira podre virado para o Tejo, o rio e porto de descanso para os colonizados que sonham conquistar, a realidade nos enganosos estratagemas de empreiteiros que fogem aos contratos. No meio disto tudo, uma frase dita por uma Ucraniana ao telefone, tentando convencer um familiar a vir para cá também: "Em Portugal tudo é bom, excepto a educação." Ao final, a cena do parto com o nascimento de um novo lisboeta, abre uma porta à esperança.
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